domingo, 30 de janeiro de 2011

Fotos

Os habituais do petisco

Base do PAIGC, tomada na véspera pelos nossos fuzos

"Canoa de balantas" no Cumbidjan

Operação no Cachéu - desembarque de fuzos

A Bofors da proa a postos de combate

LDG a chegar a Ganturé

O Pedro

Passeio em Farim - Magalhães, Sena e Carlos Cabral na macacada

Dia de caça no ilhéu do Rei
Rendição no Cachéu - NRP Dragão
A Dragão a caminho de Ganturé e nós a caminho de Bissau
Eu e o meu amigo Manel, um grande caçador
Com o filho da terra, Chico Correia, Mar. FZ em Ganturé

Quem não se lembra da "carreira de tiro" em Ganturé e dos alvos tipo passador


quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A Dicka e o Lorde – Os cães do NRP Argos

Ao chegar à Guiné, e após uns dias na INAB, fui destacado para a Hidra, que na altura se encontrava Inop. Achei a fartura muita e não me enganei: aquela vida de estar atracado à Ponte Cais a ver as Lanchas e os Patrulhas chegarem e partirem para missões, estar atento ao desembarque dos periquitos que chegavam no Uíge e no Niassa para ver se chegava algum filho da terra, sair à noite para dar umas voltas por Bissau com paragem obrigatória no Pelicano, umas idas ao cinema da UDIB, com umas travessas de ostras pelo meio, de certeza que não era para mim. E não me enganei. Passados 3 ou 4 dias já estava com guia de marcha para me apresentar na Argos. A partir daí ostras, wisky com cola e cinema só de 15 em 15 dias. 
Quando me apresentei a bordo e comecei a conhecer a malta da guarnição, dei de caras com a Dicka, uma cadela grande, cor de mel, simpática, obediente e inteligente e na altura com uma barriga medonha. Estava grávida, e segundo um camarada, dos mais antigos a bordo me informou, a cadela tinha vindo de Moçambique com o navio, sendo o pai dos próximos membros ( de 4 patas) da guarnição,  o cão da Sagitário. A partir desse momento, e durante os 22 meses da comissão, a minha relação com a Dicka foi excepcional, ao ponto de em algumas situações pontuais criar inimizade com quem fosse menos conveniente no trato com ela.   
A primeira saída da Argos comigo a bordo foi para Bolama, de madrugada. Estava de quarto (das 4 às 8), ainda pouco habituado ao viver a bordo mas numa das idas à coberta, para matar a sede, dou com a Dicka em trabalho de parto no corredor que dava acesso à câmara dos oficiais. Passado um pouco já estavam mais um ou dois marujos a colaborar como parteiros e não tardou nada já havia um” rebanho” de cachorros nascidos. Um dos cachorros, o mais parecido com a mãe, era o maior de todos, da mesma cor mas pintado de branco na zona do pescoço e nas patas. Não imaginei eu que seria esse o eleito para passar a viver a bordo. Passado algum tempo e com os bebés já “grandotes”, um dos divertimentos da malta era juntar o Zorba (o macaco) e apreciar as brincadeiras do macaco com os cachorros, com a Dicka sempre alerta e pronta a dar uma tareia no macaco caso fosse necessário. Como uma das fotos documenta, até um porco, que se encontrava na situação de adido, até fazer parte da ementa, entrou nas brincadeiras. 
Com os cachorros restantes já prontos a receber guia de marcha, não me lembro de quem partiu a ideia de que um deles ficasse a bordo para fazer parte da guarnição, recaindo a escolha no das malhas brancas. O Comandante Sarmento é que não estava muito sensibilizado mas com alguma insistência condescendeu, sendo o cachorro aumentado ao efectivo e alguém o baptizou como Lorde, nome que lhe assentava lindamente dada a sua pachorra e lentidão e dotes de” bom garfo”. Os outros foram destacados ou passaram à vida civil, tendo-se encarregado dessa tarefa o Sr. Manuel (o impedido dos oficiais) e o Joãozinho (o dos sargentos), que carregaram com eles para a tabanca. 
Com o passar do tempo, o Lorde foi crescendo e, passados uns meses, estava quase do tamanho da mãe. Desde sempre os cães foram para mim uma atracção e motivo de cuidados, não recebendo por parte deles, por vezes, a justa paga por aquilo que lhes faço, antes pelo contrário. Não sendo a Dicka e o Lorde excepção, dar-lhes comida, banho e carinho fez sempre parte das minhas obrigações durante a comissão. Os passeios a terra com visita às tabancas também faziam parte do serviço. O pior era que tanto um como outro eram muito grandes e fortes, em comparação com cães nativos, pequeninos e enfezados. Nessas visitas às tabancas, os dois eram sempre motivo de admiração por parte dos naturais da terra, acontecendo várias vezes ver o Lorde entrar pela porta da tabanca e os moradores saírem em voo picado pela abertura que fazia de janela, assustados com as dimensões dos dois. 
O grande problema do Lorde era que não tinha aptidão nenhuma para artilheiro. Eventualmente, o defeito não foi detectado na inspecção para o serviço militar, pois, assim que as Bofors faziam fogo, o bom do Lorde voava do corredor para o refeitório, sem tocar nos degraus da escada, para se ir esconder debaixo da mesa ou mesmo na coberta, e ninguém o tirava de lá enquanto não parasse o fogo das peças. Foi com grande pena que, em Novembro de 73, com o fim da comissão, tive que deixar estes dois amigos. Mais tarde fiquei sabendo que ao Lorde não lhe aconteceu nada de bom mas que a Dicka, em 74, com a ida dos navios para Angola, um dos membros da tripulação, na altura, fez questão de a trazer para a Metrópole, terminando os seus dias de vida na zona do Cartaxo.
Os meus grandes amigos: a moçambicana DICKA e o guineense LORDE

Eu e a Dicka

Zorba, o macaco, Lorde e os irmãos

Lorde ao ataque e o Zorba a ver
O Duarte também foi protector da Dicka!





quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Dos Bijagós a Bissau de reboque

Nunca nos tinha calhado em sorte um cruzeiro nas ilhas dos Bijagós, apesar de alguns camaradas de outras LFG`s me terem falado nas maravilhas das ilhas e das suas praias. Um belo dia, e de surpresa como era habitual, pois nunca tinhamos conhecimento antecipado do nosso destino, após navegarmos algumas horas, não muitas, porque a distância de Bissau até as ilhas não é nada por aí além, quando dei por mim estávamos a arrear ferro em frente a Bubaque. 
Numa primeira observação, e para quem estava habituado a rios e tarrafe, estávamos no paraíso: água cristalina, areias brancas, mais brancas que as do meu Algarve, palmeiras a cairem para dentro de água com as raíses na praia mar, passarada como nunca vira, mar chão, etc, etc, etc. Igual só vi nas Caraibas, mas trinta anos depois. Na primeira viagem do pneumático a terra, lá estava eu pronto a ir, como era meu timbre, sempre na ânsia de conhecer coisa nova. E por demais já sabia que ali não havia porrada o que facilitava imenso as coisas. A primeira surpresa ao chegar a terra foi ver um tractor agricola dum modelo já antigo e, em cima, um branco que depois vim a saber ser um canadiano que lá vivia com a familia. 
Como era habitual o Manel, electricista, carregava consigo a Flobert e lá fomos os dois para o interior à caça dos pombos verdes nos mangueiros. E era com cada um que, quando o Manel lhes acertava e vinham pelo mangueiro abaixo, ao cairem no chão, era cá um estrondo que metia respeito pois os bichos eram só” xixa”. Pudera, ninguém os caçava. Lá fomos apreciando a paisagem, matando um pombo aqui, outro acolá e, de vez em quando, ao passarmos pelas tabancas, havia sempre alguém que nos cumprimentava, gente simpática, os bijagós, de fisionomia um pouco diferente dos outros guinéus mas com a mesma pobreza dos da Guiné (continental). No interior da ilha, grandes bolanhas e lagoas, bandos de papagaios cinzentos e periquitos de toda a espécie e outra bicharada que não era habitual ver nas caçadas à volta de Ganturé ou de S.João, em Bolama. Só mais tarde vim a saber que lá existiam hipópotamos de água salgada, coisa nada habitual em África. 
Terminada a caçada, o que não me apetecia nada era voltar para bordo, mas havia os pombos para depenar, comer e beber umas cocas pois cerveja não era comigo, apesar dos enxovalhos que levava da malta por ser o único que, com a cerveja, não dava lucro à cantina. No segundo dia de cruzeiro, em Canhavaque, não fui a terra porque estava de quarto à máquina, mas não perdi nada pois, com umas sardinhas congeladas, como isco, que “fanei” ao cozinheiro, ainda fiz uma sessão de pesca à linha. E era com cada bica que metia respeito! O que dava mais gozo era ver o peixe à volta da pesca pois, com uma água cristalina como aquela, até dava para escolher qual o peixe a fisgar. 
Lá continuamos pelas outras ilhas e tudo corria dentro do normal (e segundo constava era para continuar por aquelas bandas). Numa daquelas ilhas mais pequenas, aí com 1 km de comprimento por uns 600 ou 700 mts de largura, ao irmos a terra, fomos dar com uma manada de vacas, como aquelas ou até mais pequenas das que nós sacrificávamos, em favor do rancho, na ponte de Ganturé. Houve tourada, uma correria atrás dos bichos com resultado nulo a não ser um bocado de pele duma vaquita que meteu a pata numa das rochas que havia na borda de água. 
Ao voltar para bordo, então é que começou verdadeiramente a tourada: um dos geradores MAN, mais cansados do aquilo que eu estou hoje, tinha berrado com uma cabeça lixada e o outro também ia pelo mesmo caminho, com fugas e a aquecer que nem uma caldeira. Não faltou muito e ficamos sem energia. Pensei para comigo, “antes aqui do que no Cacheu ou no Cumbijã”, pois aí a coisa dava para o torto de certeza absoluta. Ora, sem energia e sem ar comprimido, o sacana do compressor também estava como havia de ir e os Mayback não arrancavam. Por ali ficamos fundeados à espera que chegasse ajuda de Bissau e, se até ali tinha sido um cruzeiro de maravilha, então sem o ruído dos geradores e sem quartos à máquina, então é que foi o máximo. O pior era a água e o rancho, mas também houve solução, sacar as tampas de visita dos depósitos e tirar a balde. No departamento do “lavascas” é que não dava pois o fogão, sem energia, não ia a lado nenhum, mas um marinheiro nunca se enrasca e tudo se resolveu até chegar o rebocador Guiné. E lá foi fazer uma parte da viagem de braço dado e depois com cabo de reboque passado até à chegada a Bissau, apreciando a viagem e fazendo umas fotos, para mais tarde recordar do que foi o melhor Cruzeiro da comissão.



O melhor cruzeiro da comissão


A estibordo, observando a manobra de reboque, o Comandante Junqueiro Sarmento e o Imediato Câmara Alves




Bissau à vista

De braço dado com o rebocador Guiné



Mais fotos


Vidal e Carlos Cabral junto do bilhar dos matraquilhos que naquele tempo havia na ré do Argos


Vidal na cabine de telegrafista

Vidal na cabine de telegrafista

O Pinto (da Esgueira), o Pinheiro (de Cacia) e eu.
A Argos na ponte de Ganturé e os botes do destacamento.
Dia de pesca em Ganturé, um tubarão do tarrafe e um bragre.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Na procura da Guarnição de 1972-1973


        (Por: Álvaro Vidal, ao tempo Mar C.1632/70)

O Argos virou sucata.
Abandonado na baía de Luanda, corroído pelo tempo, transformou-se num decrépito monte de ferros. Outrora lar daqueles que no mar presumiam defender a Pátria, virou guarida de outros habitantes marítimos, que ignorantes de todo o seu passado assistiram à sua decomposição.
Restam as memórias do que foi, e do que foram todos aqueles que o erigiram, conservaram manobraram, defenderam, conduziram e com ele comunicaram “novos mundos ao mundo”.
Que será feito deles?
Certamente que muitos já partiram eventualmente navegando por outros mares…
E os outros, onde estão?
Provavelmente embrenhados na sua azáfama diária, com ténues memórias daquilo que foram e do que ali viveram, indiferentes, esquecidos, prosseguem a sua caminhada pela vida.
Aconteceu também comigo, até que, mais liberto, empunhando a ferramenta desta nova era, a internet, fui em busca dum passado que as nebulosas imagens da memória me colocavam no Argos, na Guiné. Procurei e encontrei o Argos, em imagens, então já corroído, esventrado, talvez mesmo em putrefacção. Uma triste nostalgia me assomou da mente e me levou a deixar ali uma nota, quiçá epitáfio, dizendo ter sido o meu lar entre Novembro de 1971 e Setembro de 1973, e deixei o meu endereço electrónico.
Talvez imbuído do mesmo espírito, o Bernardino Sena, companheiro daquele tempo, Mar. CM., encontrou a minha nota e contactou-me. Trocámos mails, falou-me da sua busca da guarnição, e mandou-me uma lista de nomes que tinha conseguido através de pedido à Marinha:

 Guarnição de 1973

 
José dos Santos Caldeira
Francisco dos Santos Mendonça
Fernando Mendes Gonçalves
Júlio Pedro Sobral Lourenço
João Brás Costa
Joaquim de Castro
José Francisco Manuel
José Manuel Simões Vaz
António Martins Oliveira
Acácio Duarte Pinto
José Manuel Jorge da Cruz
Eduardo Gonçalves Pinto de Morais
Manuel António Peres
José Manuel Queirós Pinheiro
Bernardino Reis do Nascimento Sena
José Duarte Cunha Magalhães
Joaquim Mariano Campaniço Gameiro
Álvaro da Graça Vidal
Arsénio Silvestre Sim Sim Moncarcha
Carlos Alberto Cabral Almeida
Vitor Pereira de Moura Lima
José Manuel dos Santos Silva
José Rodrigues Gonçalves
Antero Joaquim Meneses da Costa
Orlando Gouveia Silva
António da Silva Moreira
Manuel Armando da Veiga Fernandes


Lista incompleta e eventualmente errada, com a informação de que os arquivos daquele tempo não permitiam ter maior precisão. Efectuei algumas pesquisas. Localizei alguns, o Sena sabe onde se encontram outros, nomeadamente os comandantes, e há esperança de que se venham a encontrar os restantes, mesmo alguns dos que não fazem parte desta lista. Telefonei a alguns e enviei cartas a outros. Recebi boas e más notícias, e outras nem por isso.
As sementes foram lançadas, fico na esperança que possam germinar e venham a dar frutos.

Entretanto deixo os testemunhos possíveis.
O João Brás Costa, enfermeiro, que consta da lista mas esteve no Argos até Março de 1970, escreveu: “ao ver o engaço do Argos senti uma espécie de tristeza semelhante ao que sinto quando vejo uma casa que me foi familiar reduzida a escombros ou abandonada pela vida. Mas enfim tudo é finito e é por isso que existe vida e força para lutar por ela. … não consigo ajudar muito na procura desses bons amigos que todos foram. Imagens e nomes, tudo o cilindro da vida passou. …”
E juntou estas fotos:



João Brás Costa talvez em 1970 
                                                                                                 




            
                                                     Actualmente                                                                     
O Arsénio Moncarcha, ao tempo Mar A, respondeu ao apelo, e através do seu genro, mais habituado a estas modernices, enviou-nos por mail as fotos abaixo. Faltam as datas, mas creio serem posteriores a Setembro de 1973. Quem souber que forneça os esclarecimentos.